6.3.09

Redescobrir o velho mundo é preciso

Vinhedo às margens do lago Leman na Haute-Savoie (Alta Savóia).


Nos últimos vinte anos tivemos um amplo domínio dos vinhos chilenos e, mais recentemente, dos argentinos no Brasil. Essa hegemonia mexeu com o paladar brasileiro e nos afastou do velho mundo. Ficamos mais distantes da elegância e do vinho gastronômico, da diversidade de castas e cortes de uvas, de territórios onde solo, clima, método de condução do vinhedo e vinificação nos proporcionam prazeres radicalmente diferentes. Felizmente os tempos mudam e ocorre neste momento uma redescoberta dos vinhos europeus.

Entre as festas de final de ano visitei a Alta Savóia, (Haute -Savoie) nos Alpes franceses, a beira do lago Léman. Pude ter o prazer de provar vinhos que são cultivados numa região fria, onde a exposição ao sol é fundamental. Castas que não são cultivadas onde moro, no Languedoc, como a chasselas, altesse e mondeuse se destacam ao lado de outras mais tradicionais como pinot noir, gamay e chardonnay. Numa das noites, harmonizei um tradicional fondue savoiano, com um Château Ripaille, branco de uva chasselas, que se mostrou floral, ligeiramente nervoso e com notas de manteiga. Custou 21euros ou uns 65 reais e mereceu nota 7, como manda o figurino nesta faixa de preço.

O restaurante parisiense, na média, multiplica o preço de compra dos vinhos por 4 ou 5, ou seja, de 3 a 4 vezes mais caro do que na loja. À mesa, o custo França pesa mais que o custo Brasil. A jornada de 35 horas, o custo da mão de obra e todo o sistema social francês exercem sobre o vinho uma pressão, que algumas vezes, o coloca acima do preço praticado no Rio de Janeiro. Alguns restaurantes brasileiros têm uma estratégia de mercado focada no vinho. Por terem maior giro dos produtos, estão comprando melhor e vendendo com percentuais de apenas 60% a 150% sobre o preço de compra, como os cariocas Artigianno e Montagú, muito abaixo do percentual praticado na França. O que democratiza o vinho e aumenta as vendas. Esta é a tendência para quem quer vender vinho.

Qual a solução do francês, este pão duro incorrigível? Pede o tradicional pichet, jarra de vinho. A boa qualidade média dos vinhos permite oferecer esta bebida do dia a dia, aquela que tem nota entre 6 e 7, a bom preço. Uma jarrinha de 250 ml, medida certa para uma pessoa poder dirigir, por aqui, sem risco de multa, custa uns 12 reais. Muitos restaurantes oferecem vinhos de Denominação de Origem Controlada, o AOC, especialmente os do Sul da França, de melhor relação qualidade/preço, também em jarra. Assim diversificam a oferta e melhoram a qualidade. Não se trata de vinho de garrafão, mas de vinhos acondicionados em BIBs (Bag In Box), de 3 a 20 litros, que permitem sua conservação por várias semanas depois de abertos. Afinal, o vinho do dia a dia tem metade de seu custo de produção na garrafa. E não bebemos a garrafa, como brincou o notável ator David Niven. Outra boa opção em restaurante é a meia garrafa, 375 ml, cada vez mais presente.

Neste momento de alta do dólar a tendência é de que os preços dos vinhos do Chile e Argentina se aproximem dos preços europeus. A mágica é simples. O euro caiu em relação ao dólar e subiu menos que este em relação ao real. Nestes tempos de redescoberta dos vinhos do velho mundo isso será um estímulo à curiosidade do consumidor. Vale a pena aproveitar as ofertas de delis e supermercados do começo de ano já que estes estarão fazendo promoções de vinhos comprados no saudoso câmbio de 2008.
Originalmente publicado no Guia JB Vinhos. Versão integral.